sábado, 1 de setembro de 2012

ESTUDO SOBRE O PAI NOSSO, A ORAÇÃO DO BOM FILHO (2ª parte)



PAI ETERNO - Pintura de Zurbaràn
PAI NOSSO

Como Jesus é incrível. Ensinando a seus discípulos como deveriam rezar, além de chamar a Deus de Pai, disse ainda: “nosso”! Que audácia divina e que sinceridade, meus irmãos e irmãs!
Como falamos no tópico anterior, o Povo Eleito tinha a Iahweh (nome santíssimo de Deus) como o “todo-poderoso”, o “altíssimo” ou “Senhor”. Dizer que Deus é Pai já foi uma grande revelação por parte de Jesus. Agora Ele revela ainda mais: Deus Pai é nosso!
Toda estrada celeste tem “duas mãos”. No Antigo Testamento, Jacó, em um sonho revelador, viu uma escada que ligava o Céu à terra na qual anjos subiam e desciam. Jesus, falando ao apóstolo São Felipe disse que um dia eles veriam anjos “subindo e descendo” sobre o Filho do Homem (conferir em).
Quando lermos, rezarmos ou meditarmos a oração do Pai Nosso, sempre tentemos fazer o seguinte exercício: tentemos pensar com a mente de Jesus. Façamos as seguintes perguntas: o quê Ele quis dizer com isso? O quê Jesus quis nos comunicar ao dizer essa ou aquela palavra? Que sentido Ele quis aplicar?
Primeiramente, quem é Jesus? Jesus é o Filho Único de Deus feito homem. Jesus é o Verbo humanado: a Segunda Pessoa da Santíssima Trindade, Deus e Senhor, que se fez homem para nos salvar. Portanto, Jesus é o Filho Único de Deus. Ninguém é filho ou filha de Deus fora de Jesus. Jesus é quem nos faz filhos ou filhas adotivos de Deus, seu Pai.
Quando Jesus diz: “Pai Nosso”, Ele está nos dizendo: “Esse Pai, que é meu Pai, eu O faço vosso Pai. Desde que Eu vim ao mundo, fazendo-Me homem verdadeiro, Ele passou a ser também vosso Pai. Por isso, de agora em diante, vocês podem rezar dizendo: Pai Nosso”. Claro que, para sermos esses filhos e filhas de Deus Pai temos primeiro que ser adotados por Ele. A adoção filial é concedida à criatura humana no santo Batismo. No Batismo, os méritos infinitos da Encarnação e Redenção são “derramados” sobre o homem e a mulher, transformando-os em “criaturas novas”, à semelhança da humanidade santíssima do Filho Único de Deus, Jesus. Na alma do batizando é impresso a “marca” ou “caráter” indelével de Cristo, que tornam aquela pessoa filho ou filha adotivos de Deus.
Portanto, nesta “estrada” ou “escada” da graça que nos ligam a Deus Pai, há um Cristo que nos liga a Deus (caminho ascendente), bem como um Cristo que liga Deus a nós (caminho descendente). O ponto de união é Cristo Jesus. Sem Jesus jamais poderíamos sequer sonhar em sermos filhos e filhas de Deus!
O termo “nosso” denota intimidade ou – poderíamos até ousar dizer – posse. Porém, como Deus Pai é o verdadeiro Pai apenas de Jesus (somos filhos e filhas adotivos, por causa de Cristo), oficialmente jamais poderíamos chamá-lO de “Pai meu”. Claro que, em nossas preces particulares podemos rezar dizendo: “meu querido Deus”, “meu querido Pai” ou ainda “meu Paizinho do Céu”. Mas, como o Pai Nosso é uma oração da Igreja, isto é, de todos os que estão unidos a Deus pelo Batismo, com Cristo, por Cristo e em Cristo, temos que dizer “Pai Nosso”. Isso mesmo. Deus Pai é nosso! Mais do que motivo de orgulho, isso deve ser para nós razão de grande responsabilidade.
Se Deus é nosso, tudo que é de Deus é nosso. Nossa filiação gera compromisso com o Pai. O Pai também se compromete a partilhar tudo conosco. Ele partilha seu Amor Trinitário, sua vida eterna, sua salvação, sua graça, seu Amor Cáritas e Ágape e seu Reino (veremos na continuação das explicações sobre o Pai Nosso). O Pai se dá, se doa. Deveríamos nos doar por inteiro ao Pai, sem reservas ou outros “amores” e empecilhos. Se Deus Pai é nosso, tudo dEle deveria ser nosso também, de modo especial sua santa vontade (veremos também mais sobre isso mais à frente). Como somos fracos e imperfeitos no amor quando não vivemos esse “nosso teologal”, isto é, essa “união com Deus” que deveria ser vivida de forma intensa e perfeita.
Do ponto de vista de nossos irmãos e irmãs, a palavra “nosso” é uma palavra eclesial. Ela denota união, participação, solidariedade e partilha. Não estamos sozinhos no mundo. Mesmo os que estão isolados em uma ilha deserta ou em uma floresta, participam da mesma humanidade espalhada pelo mundo inteiro. Fazem parte do coletivo. Deus se dá a nós, seus filhos e filhas. Não podemos ser egoístas. Se Deus não é egoísta, que direito temos de sê-lo? O mesmo bem que Ele nos quer, Ele quer a todos os que habitam a face da Terra, especialmente aos que se fizeram seus filhos e filhas, na participação da filiação única de Deus Filho, Jesus Cristo.
Assim, não podemos jamais desejar ou pedir em nossas preces apenas o nosso bem. Na oração do Pai Nosso rezamos com nossas próprias bocas, no entanto, falamos pela boca de todos.  Uma boca, e, cada boca, fala pelo todo, numa única oração universal. Que riqueza, não é? Que bela participação nos bens divinos, especialmente o da salvação eterna, que Deus avidamente quer derramar sobre todos os seus filhos e filhas!
Interessante notar que na oração do Pai Nosso esse termo “nosso” é usado duas vezes: na primeira parte da prece, dita “parte teologal”, bem como na segunda parte de prece, a parte “humana” da mesma, quando se fala do “pão” ou subsistência humana. Veremos mais à frente que realmente “nosso” é uma palavra muito forte. Pouco a compreendemos em seu real significado.


QUE ESTAIS NOS CÉUS

Infelizmente, raras são as pessoas que rezam esse trecho do Pai Nosso corretamente. Na maioria das vezes dizem: “Pai nosso, que estais no céu”. Sim, Deus Pai está no céu, isto é, no Paraíso Celeste, onde fica seu Trono de glória infinita. No entanto, nesta frase, a palavra usada é “céus”. A oração do Pai Nosso em latim assim se expressa: Pater noster qui es in coelis, portanto, o certo é mesmo “que estais nos céus”. Mas, que “céus” seriam esses?
As Sagradas Escrituras mostram que Deus se compraz em estar com seus filhos e filhas. O coração humano, que ama a Deus e faz sua vontade é um verdadeiro céu para Deus. No evangelho de São João, Jesus diz: “Se alguém Me ama, guardará minha palavra e meu Pai o amará, e nós viremos a ele e faremos nele a nossa morada” (João 13, 23).
Como podemos entender isso? Como pode um coração, isto é, a alma humana ser morada de Deus? Não somos imperfeitos e indignos dEle? Sim, no entanto, o amor tudo pode. “A Deus nenhuma coisa é impossível” (Lucas 1, 37). O Amor de Deus transpõe todas as “barreiras naturais” que nos separam dEle. Encarnando-Se no seio da Virgem Maria e morrendo por nós em uma cruz, Jesus Cristo reconciliou-nos com o Pai, tornando possível a amizade primitiva que o homem e a mulher haviam perdido pelo pecado.
No santo Batismo, a Trindade faz do interior do ser humano batizado sua nova morada. A presença divina torna o lugar onde Ela está um “novo Céu” ou “Paraíso terrestre”, um Éden de delícias onde Deus encontra alegria e conforto. Onde está Deus, aí está o céu.
Como cristãos, podemos sim e temos o dever de sermos novos céus para nosso Deus. Para isso, temos que fazer o que Jesus nos pede: amá-lO e guardar Sua palavra.
O amor a Deus atrai o Amor de Deus. Não existe nada mais óbvio que isso. Deus é louco de amor por nós. Se Ele ama até mesmo aos pecadores, como não amará ainda mais quem O ama? Quanta alegria ao Coração de Deus estar em um coração que O ama! Nem todo o Céu, nem os louvores das multidões dos Anjos bastam para nosso Deus. Ele quer nosso coração, quer ser amado por cada um de seus filhos e filhas tão queridos, objetos de todo o seu amor.
Guardar a Palavra de Deus em nossos corações é guardar o próprio Deus. A Palavra de Deus também é Deus, conforme nos diz São João Evangelista: “No princípio era o Verbo (Palavra), e o Verbo estava junto de Deus e o Verbo era Deus” (João 1, 1). Quem guarda, isto é, quem medita, obedece e vive a Palavra de Deus em seu coração, guarda em si o a presença do próprio Deus vivo, que se apraz em estar com os filhos dos homens.
Todo bom filho de Deus e toda boa filha tem o dever de viver em intimidade com esse Pai maravilhoso. Pena que não amamos a Deus Pai como merece e quer ser amado.
Se fôssemos mais amorosos, certamente seríamos muito felizes. Viveríamos – mesmo em meio às cruzes e tribulações cotidianas – em contínuo estado de paz interior, de alegria perfeita e felicidade perene. Nada nos abalaria a fé, a confiança em Deus e nosso equilíbrio emocional. Mesmo a mais dolorosa prova seria suportada e superada em paz.
Facilmente podemos intuir com isso que seríamos verdadeiros “céus na terra”. Nossos corações seriam outros “céus” onde Deus acharia toda delícia, toda honra, toda glória e todo o contentamento que encontra no Céu empíreo. Deus moraria “em paz” em nossos corações. Seríamos “portas do céu” na terra. Todos sentiriam que Deus está conosco. Seríamos o terror dos demônios. Venceríamos facilmente todas as tentações. Se isso não acontece, é porque não vivemos em união com nosso Deus. Podemos até de dizer que gostamos das coisas de Deus, que O amamos. Infelizmente, no entanto, se pecamos é porque não amamos a Deus perfeitamente e nem cremos e vivenciamos a presença de Deus em nós: “Aquele que diz conhecê-lO e não guarda os seus mandamentos é mentiroso e a verdade não está nele. Aquele, porém, que guarda a sua palavra, nele o amor de Deus é verdadeiramente perfeito” (I João 2, 4-5b). 
Giovani Carvalho Mendes, ocds

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