O verdadeiro João Paulo II, explicado pelo postulador de sua causa
Livro apresentado à imprensa em Roma
Por Anita S. Bourdin
ROMA, quarta-feira, 27 de janeiro de 2010 (ZENIT.org)
João Paulo II é o mesmo em público e em privado: “transparente, sincero, íntegro”.
Foi assim que o postulador da causa de beatificação, monsenhor Slawomir Oder, qualificou João Paulo II, também como conclusão dos 114 depoimentos ouvidos para a instrução da causa.
O livro publicado em italiano pela editora Rizzoli – “Perché è santo. Il vero Giovanni Paolo II raccontato dal postulatore della causa di beatificazione” – foi apresentado ontem em Roma por monsenhor Slawomir Oder, postulador, e pelo autor, Saverio Gaeta, com uma intervenção especial do prefeito emérito da Congregação para as Causas dos Santos, cardeal José Saraiva Martins.
Mas neste momento, em que ponto se encontra a causa?
No último dia 19 de dezembro, Bento XVI assinou o decreto da Congregação que reconhece as virtudes heroicas humanas e cristãs do Papa Wojtyla, que permite ostentar o título de “venerável”.
As diversas comissões (de médicos, teólogos), explica monsenhor Oder, estão examinando a cura extraordinária ocorrida na França – em Aix en Provence, por intercessão de João Paulo II – da Irmã Marie Simon Pierre.
Trata-se de uma religiosa das Maternidades Católicas que sofria da Doença de Parkinson, cujos sintomas desapareceram.
Se este “suposto milagre” for reconhecido pela Congregação para as Causas dos Santos, o Papa Bento XVI poderia decidir a beatificação.
Monsenhor Oder, por sua vez, destacou que a cura “francesa” foi escolhida para ser apresentada ao exame da Congregação romana, entre outras razões, pelo fato da “simplicidade”, da ausência total de montagem da pessoa curada, na carta escrita pela superiora à postulação.
Nesta carta, não havia “nada inútil”, enquanto em outros casos se destaca primeiro a “santidade” da pessoa curada.
Também pelo fato de que a religiosa sofria a mesma doença do Papa João Paulo II; e, finalmente, porque sua cura lhe permitirá voltar à sua atividade ao serviço da vida nascente, uma causa que João Paulo II tinha no coração.
Documentos inéditos
O que o livro traz como novidade são os documentos inéditos procedentes destes 114 testemunhos.
Trata-se de documentos dos serviços secretos poloneses, a menção dos serviços secretos italianos, a carta de demissão no caso de incapacidade por causa da enfermidade (em italiano), a carta aberta a Ali Agca nunca publicada (em polonês) e os testemunhos sobre sua vida mística.
Os serviços secretos poloneses espionaram o sacerdote Karol Wojtyla, depois o bispo, em seus compromissos públicos e sua vida privada, foi assim desde maior de 1946 (inclusive antes de sua ordenação a um de novembro de 1946).
Após sua nomeação como auxiliar da Cracóvia, a vigilância se fez mais estrita. E nos anos sessenta, dedicou-se toda uma estrutura a sua vigilância.
Depois de sua eleição, em 1978, o arquivo que o comunicava a Varsóvia encheu-se com 18 caixas de documentos.
Mas os serviços eram muito otimistas: diziam que a visão “ampla” de Roma faria o Papa descobrir “os grandes limites do capitalismo”, de modo que se daria conta dos “valores do comunismo”.
Foi seu chofer Jozef Mucha quem informou o arcebispo Wojtyla da morte de João Paulo I, que lhe causou uma emoção intensa.
Ele rogou longamente: “que o Senhor nos quer dizer com isso?”, disse aos membros de seu secretariado.
Antes de tomar o avião a Roma, seu chofer lhe desejou que voltasse logo. “Não sei”, respondeu, “em um tom sério, com um ar de tristeza”.
Quando foi nomeado auxiliar de Cracóvia, cerca de vinte anos antes, seu bispo, Dom Eugeniusz Baziak, o tomou pelo braço e conduziu a alguns sacerdotes presentes na sala de espera, dizendo: “Habemus Papam”...
Um testemunho afirma que os serviços secretos italianos tinham advertido o Vaticano, antes do atentado de 1981, que as “Brigadas Vermelhas” planejavam um “sequestro” do Papa.
Isso poderia explicar a frase inacabada pronunciada por João Paulo II na ambulância e comunicada pela cardeal Dziwisz: “Como para Bachelet...”: uma vítima deste grupo terrorista italiano de extrema esquerda. Suas operações (atentados e assassinatos) causaram 415 mortes entre os anos 1969 e 1988.
O perdão, dom de Deus
Outro documento interessante, com data de 11 de setembro de 1981, e que não tinha sido publicado, talvez porque o processo ainda estivesse em curso, é a “Carta aberta a Ali Agca”, sugeriu monsenhor Oder.
A 27 de dezembro de 1983, o Papa teve um longo encontro com seu agressor no cárcere em Rebibbia.
Ele destacou depois que tinha querido reiterar-lhe o perdão que já lhe havia dado “imediatamente”.
Mas, comenta Dom Oder, o Papa quis insistir no fato de que este perdão, outorgado desde a ambulância, a 13 de maio de 1981, não era só um passo “afetivo”, “emotivo”, do momento, mas um “dom de Deus” que formava parte de seu ministério como Papa.
Ele preparou esta carta para a catequese de 21 de outubro de 1981. O texto foi encontrado com um grande “X” traçado sobre ele.
Outro documento é um texto em italiano, com os acentos tônicos marcados à mão, como se fosse um texto destinado a ser pronunciado.
O cardeal Saraiva Martins, que ainda não era membro do colégio cardinalício, não pôde dizer se foi efetivamente pronunciado ante o colégio de cardeais ou não.
O Papa dizia, essencialmente, que pensava no “que devia fazer o Papa aos 75 anos”, idade canônica de renúncia do cargo para os bispos desde Paulo VI.
No entanto, baseou-se no exemplo de Paulo VI para decidir não “renunciar ao mandato apostólico a não ser que existisse uma enfermidade incurável ou uma incapacidade que fizesse impossível o exercício das funções do Sucessor de Pedro”.
O texto de Paulo VI é de 2 de fevereiro de 1965. Um primeiro texto de João Paulo II está datado de 2 de fevereiro – a mesma data – de 1989, e outro, em 1994.
Ele acreditou em 1992 que seu tumor no intestino não era maligno; não foi o caso. Depois vieram as quedas e a fratura do ombro direito (1993), a dor nas costas e a fratura no fêmur direito (1994).
A via mística
O livro também fala de “mortificações corporais” e de vários aspectos de sua vida mística e de sua vida de oração.
O cardeal Saraiva confiou ter-se sentido surpreendido pela profundidade de seu recolhimento quando ele convidava alguém para comer e a visita começava com uma oração silenciosa na capela privada.
“Estava como que absorvido por Deus. Era um homem de Deus e sua oração intensa era uma verdadeira evangelização”.
O cardeal Saraiva também destacou sua profunda devoção a Maria e citou a “alegria”, a “felicidade” que João Paulo II manifestou no ano 2000, após a beatificação dos dois pastorinhos de Fátima, Francisco e Jacinta Marto, a 13 de maio.
Uma testemunha afirma que, à pergunta “o senhor vê a Virgem?”, o Papa respondeu: “não, mas a ouço”. Como o Padre Pio, João Paulo II confiou a uma testemunha que a “viu”.
Sobre os santos, o Papa João Paulo II havia confiado ao cardeal Saraiva Martins que seu dicastério era o mais importante porque trata “do mais importante da Igreja”, que é “a santidade” e que todos os demais dicastérios estão desenhados para servir a esta santidade.
O livro relata esta resposta do Papa a uma religiosa que lhe expressou sua “preocupação” por Sua Santidade: “eu também estou preocupado por minha santidade”.
Finalmente, Dom Oder destacou “a humanidade” do Papa e sua capacidade de perceber em todas as pessoas a marca de Deus.
O cardeal Saraiva destacou que a humanidade e a santidade são uma só coisa: quanto mais santo se é, se faz mais humano.
Junto aos documentos inéditos, o autor, Saverio Gaeta, destacou que o título do livro (“O verdadeiro João Paulo II explicado pelo postulador da causa de beatificação”) não quer dizer que as demais biografias não sejam verdadeiras, mas que o João Paulo II descrito no livro é o que as testemunhas que intervêm conheceram pessoalmente.
O próprio Papa teria indicado que a melhor forma de ser compreendido seria se olhado “a partir do interior”.
Livro apresentado à imprensa em Roma
Por Anita S. Bourdin
ROMA, quarta-feira, 27 de janeiro de 2010 (ZENIT.org)
João Paulo II é o mesmo em público e em privado: “transparente, sincero, íntegro”.
Foi assim que o postulador da causa de beatificação, monsenhor Slawomir Oder, qualificou João Paulo II, também como conclusão dos 114 depoimentos ouvidos para a instrução da causa.
O livro publicado em italiano pela editora Rizzoli – “Perché è santo. Il vero Giovanni Paolo II raccontato dal postulatore della causa di beatificazione” – foi apresentado ontem em Roma por monsenhor Slawomir Oder, postulador, e pelo autor, Saverio Gaeta, com uma intervenção especial do prefeito emérito da Congregação para as Causas dos Santos, cardeal José Saraiva Martins.
Mas neste momento, em que ponto se encontra a causa?
No último dia 19 de dezembro, Bento XVI assinou o decreto da Congregação que reconhece as virtudes heroicas humanas e cristãs do Papa Wojtyla, que permite ostentar o título de “venerável”.
As diversas comissões (de médicos, teólogos), explica monsenhor Oder, estão examinando a cura extraordinária ocorrida na França – em Aix en Provence, por intercessão de João Paulo II – da Irmã Marie Simon Pierre.
Trata-se de uma religiosa das Maternidades Católicas que sofria da Doença de Parkinson, cujos sintomas desapareceram.
Se este “suposto milagre” for reconhecido pela Congregação para as Causas dos Santos, o Papa Bento XVI poderia decidir a beatificação.
Monsenhor Oder, por sua vez, destacou que a cura “francesa” foi escolhida para ser apresentada ao exame da Congregação romana, entre outras razões, pelo fato da “simplicidade”, da ausência total de montagem da pessoa curada, na carta escrita pela superiora à postulação.
Nesta carta, não havia “nada inútil”, enquanto em outros casos se destaca primeiro a “santidade” da pessoa curada.
Também pelo fato de que a religiosa sofria a mesma doença do Papa João Paulo II; e, finalmente, porque sua cura lhe permitirá voltar à sua atividade ao serviço da vida nascente, uma causa que João Paulo II tinha no coração.
Documentos inéditos
O que o livro traz como novidade são os documentos inéditos procedentes destes 114 testemunhos.
Trata-se de documentos dos serviços secretos poloneses, a menção dos serviços secretos italianos, a carta de demissão no caso de incapacidade por causa da enfermidade (em italiano), a carta aberta a Ali Agca nunca publicada (em polonês) e os testemunhos sobre sua vida mística.
Os serviços secretos poloneses espionaram o sacerdote Karol Wojtyla, depois o bispo, em seus compromissos públicos e sua vida privada, foi assim desde maior de 1946 (inclusive antes de sua ordenação a um de novembro de 1946).
Após sua nomeação como auxiliar da Cracóvia, a vigilância se fez mais estrita. E nos anos sessenta, dedicou-se toda uma estrutura a sua vigilância.
Depois de sua eleição, em 1978, o arquivo que o comunicava a Varsóvia encheu-se com 18 caixas de documentos.
Mas os serviços eram muito otimistas: diziam que a visão “ampla” de Roma faria o Papa descobrir “os grandes limites do capitalismo”, de modo que se daria conta dos “valores do comunismo”.
Foi seu chofer Jozef Mucha quem informou o arcebispo Wojtyla da morte de João Paulo I, que lhe causou uma emoção intensa.
Ele rogou longamente: “que o Senhor nos quer dizer com isso?”, disse aos membros de seu secretariado.
Antes de tomar o avião a Roma, seu chofer lhe desejou que voltasse logo. “Não sei”, respondeu, “em um tom sério, com um ar de tristeza”.
Quando foi nomeado auxiliar de Cracóvia, cerca de vinte anos antes, seu bispo, Dom Eugeniusz Baziak, o tomou pelo braço e conduziu a alguns sacerdotes presentes na sala de espera, dizendo: “Habemus Papam”...
Um testemunho afirma que os serviços secretos italianos tinham advertido o Vaticano, antes do atentado de 1981, que as “Brigadas Vermelhas” planejavam um “sequestro” do Papa.
Isso poderia explicar a frase inacabada pronunciada por João Paulo II na ambulância e comunicada pela cardeal Dziwisz: “Como para Bachelet...”: uma vítima deste grupo terrorista italiano de extrema esquerda. Suas operações (atentados e assassinatos) causaram 415 mortes entre os anos 1969 e 1988.
O perdão, dom de Deus
Outro documento interessante, com data de 11 de setembro de 1981, e que não tinha sido publicado, talvez porque o processo ainda estivesse em curso, é a “Carta aberta a Ali Agca”, sugeriu monsenhor Oder.
A 27 de dezembro de 1983, o Papa teve um longo encontro com seu agressor no cárcere em Rebibbia.
Ele destacou depois que tinha querido reiterar-lhe o perdão que já lhe havia dado “imediatamente”.
Mas, comenta Dom Oder, o Papa quis insistir no fato de que este perdão, outorgado desde a ambulância, a 13 de maio de 1981, não era só um passo “afetivo”, “emotivo”, do momento, mas um “dom de Deus” que formava parte de seu ministério como Papa.
Ele preparou esta carta para a catequese de 21 de outubro de 1981. O texto foi encontrado com um grande “X” traçado sobre ele.
Outro documento é um texto em italiano, com os acentos tônicos marcados à mão, como se fosse um texto destinado a ser pronunciado.
O cardeal Saraiva Martins, que ainda não era membro do colégio cardinalício, não pôde dizer se foi efetivamente pronunciado ante o colégio de cardeais ou não.
O Papa dizia, essencialmente, que pensava no “que devia fazer o Papa aos 75 anos”, idade canônica de renúncia do cargo para os bispos desde Paulo VI.
No entanto, baseou-se no exemplo de Paulo VI para decidir não “renunciar ao mandato apostólico a não ser que existisse uma enfermidade incurável ou uma incapacidade que fizesse impossível o exercício das funções do Sucessor de Pedro”.
O texto de Paulo VI é de 2 de fevereiro de 1965. Um primeiro texto de João Paulo II está datado de 2 de fevereiro – a mesma data – de 1989, e outro, em 1994.
Ele acreditou em 1992 que seu tumor no intestino não era maligno; não foi o caso. Depois vieram as quedas e a fratura do ombro direito (1993), a dor nas costas e a fratura no fêmur direito (1994).
A via mística
O livro também fala de “mortificações corporais” e de vários aspectos de sua vida mística e de sua vida de oração.
O cardeal Saraiva confiou ter-se sentido surpreendido pela profundidade de seu recolhimento quando ele convidava alguém para comer e a visita começava com uma oração silenciosa na capela privada.
“Estava como que absorvido por Deus. Era um homem de Deus e sua oração intensa era uma verdadeira evangelização”.
O cardeal Saraiva também destacou sua profunda devoção a Maria e citou a “alegria”, a “felicidade” que João Paulo II manifestou no ano 2000, após a beatificação dos dois pastorinhos de Fátima, Francisco e Jacinta Marto, a 13 de maio.
Uma testemunha afirma que, à pergunta “o senhor vê a Virgem?”, o Papa respondeu: “não, mas a ouço”. Como o Padre Pio, João Paulo II confiou a uma testemunha que a “viu”.
Sobre os santos, o Papa João Paulo II havia confiado ao cardeal Saraiva Martins que seu dicastério era o mais importante porque trata “do mais importante da Igreja”, que é “a santidade” e que todos os demais dicastérios estão desenhados para servir a esta santidade.
O livro relata esta resposta do Papa a uma religiosa que lhe expressou sua “preocupação” por Sua Santidade: “eu também estou preocupado por minha santidade”.
Finalmente, Dom Oder destacou “a humanidade” do Papa e sua capacidade de perceber em todas as pessoas a marca de Deus.
O cardeal Saraiva destacou que a humanidade e a santidade são uma só coisa: quanto mais santo se é, se faz mais humano.
Junto aos documentos inéditos, o autor, Saverio Gaeta, destacou que o título do livro (“O verdadeiro João Paulo II explicado pelo postulador da causa de beatificação”) não quer dizer que as demais biografias não sejam verdadeiras, mas que o João Paulo II descrito no livro é o que as testemunhas que intervêm conheceram pessoalmente.
O próprio Papa teria indicado que a melhor forma de ser compreendido seria se olhado “a partir do interior”.
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